Legislação que renova as autorizações para uso da malha garante contrapartidas e investimentos para o setor.

Autoridades e especialistas do setor ferroviário foram unânimes em afirmar que a Medida Provisória (MP) 752, transformada na Lei Federal 13.448, de 2017, que renova com 10 anos de antecedência os contratos de concessão para uso das ferrovias no Brasil, representa uma oportunidade única de promover a revitalização da malha e gerar desenvolvimento econômico e mobilidade urbana. A constatação foi feita ao longo do Debate Público – Minas de Volta aos Trilhos, realizado pela Comissão de Desenvolvimento Econômico da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na manhã desta terça-feira (12/12/17).

A lei garante contrapartidas necessárias e a criação de um fundo para conservação e melhorias da malha, além de definir os destinos e os usos das ferrovias no Estado. Diante disso, o membro da ONG Trem, André Louis Tenuta Azevedo, fez um histórico das ferrovias em Minas para mostrar seu ápice e depressão ao longo do tempo, como forma de apontar o melhor caminho para esta modalidade de transporte.

De acordo com ele, a primeira linha mineira foi construída em 1867 e o ano de 1961 marcou o auge da malha ferroviária em Minas e no Brasil, com a extensão de 8.450 quilômetros. “A partir disso, deu-se início a um deficit administrativo, que se dava por condições técnicas precárias, empreguismo na rede, ineficiência de gestão, política de preços baixo e pela concorrência de rodovias, entre outros aspectos”, disse.

Diante desse cenário, houve um esforço de racionalização nas décadas de 70 e 80 e, na década de 90, a malha foi privatizada por meio de concessões. “Como a ANTT só foi criada em 2001, houve um período sem regulação. Agora, a MP 752 e a Lei 13.448 se mostram confusas, uma vez que permitem que as concessionárias assumam apenas corredores de exportação. Temos que aproveitar esse momento para mudar a realidade”, alertou.

Subutilização – O representante da Sociedade Mineira de Engenheiros, José Antônio Silva Coutinho, também defendeu a criação de um fundo para o setor ferroviário e destacou que as concessões, hoje, usam apenas 1/3 da malha disponível, o que faz com que as ferrovias representem apenas 30% da estrutura de transportes.

O professor da Escola de Engenharia da UFMG, Ronderson Hilário, e o analista de Tarifas da BHTrans, Nélson Dantas, pediram mais investimentos em transporte ferroviário de cargas e passageiros, mas alertaram para a importância do aproveitamento da estrutura que já existe. “A intervenção no transporte ferroviário deve ser feita a partir da renovação das concessões. Nossas cidades ressentem uma melhor mobilidade urbana e as ferrovias são o caminho”, sugeriu Dantas.

Concessões querem conciliar interesses públicos e privados

O gerente de Projetos Ferroviários da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Jean Mafra, que é responsável pela regulação do setor e das novas concessões, explicou que a Lei 13.448 quer conciliar os objetivos do setor privado com as necessidades públicas. Em sua fala, lembrou que, quando da privatização das ferrovias, em 1996, os contratos priorizavam o transporte de cargas sem nenhuma contrapartida para a sociedade.

Disse que as prorrogações dos contratos estão sendo discutidas, desde 2015, na agência e por meio de audiências públicas regionais e que os lucros consequentes dos contratos serão convertidos em melhorias para o setor ferroviário. “Os contratos devem estar de acordo com as boas práticas de regulação e fiscalização, além de ampliarem o compartilhamento de infraestrutura e serem submetidos à participação e controle social”, salientou.

O coordenador de obras ferroviárias do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), Marcelo Chagas, lembrou que a segurança da malha ferroviária nas áreas urbanas é uma prioridade do órgão. Anunciou, também, obras e projetos de controle ferroviários já realizados em diversas cidades do Estado. “A crise econômica tem impedido que outras intervenções sejam feitas na malha, mas esperamos obter novos recursos federais no ano que vem”, afirmou.

Participação social – O diretor Executivo da Associação Nacional de Transportes Ferroviários (ANTF), Fernando Simões Paes, explicou que as audiências públicas para debater a renovação dos contratos têm sido importantes para que o trabalho seja feito de forma eficiente para as regiões impactadas. “Em 2018, estão previstas estas atividades em Minas Gerais. Antes disso, nada será definido no que se refere às concessões no Estado”, garantiu.

Para ele, a privatização foi uma decisão acertada, mas que ainda precisa ser evoluída para ampliar a malha e torná-la mais eficiente para a população.

Frente parlamentar Mineira Pró-Ferrovias deve ser criada

O Debate Público contou com a participação de diversos deputados, que defenderam a importância da malha ferroviária como instrumento de melhoria da mobilidade urbana, assim como a realização, em todas as regiões do Estado, de audiências públicas para tratar da renovação dos contratos de concessão. A criação de uma frente parlamentar específica para o segmento também foi tratada.

O autor do requerimento que solicitou o debate e presidente da comissão, deputado Roberto Andrade (PSB), disse que o que foi feito com as ferrovias foi um crime, uma vez que o patrimônio do povo brasileiro teria sido abandonado. Para tanto, pediu o resgate do que sobrou da malha para melhorar a mobilidade urbana.

O também requerente da atividade, deputado João Leite (PSDB), solicitou a ampliação da malha ferroviária mineira, em especial nos trens de transporte de passageiros, e a criação da frente parlamentar em favor das ferrovias.

A deputada Marília Campos (PT) afirmou que Minas está atrasada no que se refere à mobilidade urbana, já que há pouco investimento no transporte coletivo. “A estrutura existente é subutilizada, em especial na Capital. É impossível promover qualidade de vida e desenvolvimento sem o correto investimento em transporte ferroviário”, alertou.

Renovação – O deputado Antônio Jorge (PPS) lembrou que o tema é recorrente no Parlamento, o que demonstra sua importância para o Estado. Destacou que há evidências nacionais e internacionais da eficiência desta modalidade de transporte, mas que, no Brasil, a estrutura está se deteriorando sem que nada seja feito. “O processo de renovação das concessões torna o momento propício para buscar um objetivo mais efetivo”, pediu.

O deputado Celinho do Sinttrocel (PCdoB) lamentou que as rodovias estão em mal estado, matam milhares de pessoas no Brasil, e, ainda assim, são a principal via de transporte de passageiros. Defendeu também, a importância de obtenção de mais recursos para o segmento.

Audiências – Ao final, diversos parlamentares solicitaram à ANTT que realize audiências públicas em diversas regiões mineiras. Enquanto a deputada Celise Laviola (PMDB) solicitou um debate no Rio Doce, os deputados Noraldino Júnior (PSC) e Isauro Calais (PMDB) querem uma audição em Juiz de Fora (Zona da Mata), a deputada Marília Campos, na Região Metropolitana de Belo Horizonte e o deputado Celinho do Sinttrocel, no Vale do Aço. “Espero que a população seja realmente ouvida antes das definições quanto às concessões. Cada local tem especificidades que precisam ser levadas em consideração”, pontuou Noraldino Júnior.

Ao fim do debate o deputado João Leite leu um documento intitulado “Carta de Minas Gerais – Minas de Volta aos Trilhos”, contendo as principais conclusões e propostas levantadas durante o debate. Entre elas estão a retomada de investimentos nas ferrovias, potencializando o transporte de carga e de passageiros; a conservação e recuperação do patrimônio histórico, artístico e cultural ligado às ferrovias; o estudo da cessão de trechos ferroviários subutilizados, com a finalidade de exploração do transporte de passageiros por parte dos municípios, particulares e organizações da sociedade civil, entre outros. A ideia, segundo o parlamentar, é encaminhar o documento ao Governo Federal.

Roberto Andrade foi um dos autores do requerimento que solicitou o debate público

Fonte: ALMG